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DISCURSO DO PAPA BENTO XVI
AOS PARTICIPANTES NA PLENÁRIA
DA PONTIFÍCIA ACADEMIA DAS CIÊNCIAS

Sala Clementina
Quinta-feira, 8 de Novembro de 2012

 

Excelências
Ilustres Senhores e Senhoras

Saúdo os membros da Pontifícia Academia das Ciências por ocasião desta Assembleia Plenária e expresso a minha gratidão ao vosso presidente, professor Werner Arber, pelas cordiais palavras de saudação que me dirigiu em vosso nome. Tenho o prazer de cumprimentar o Bispo Marcel Sánchez Sorondo, vosso Chanceler, e agradeço-lhe pelo importante trabalho que faz para vós.

A presente sessão plenária sobre «Complexity and Analogy in Science: Theoretical, Methodological and Epistemological Aspects» (Complexidade e analogia na ciência: aspectos teoréticos, metodológicos e epistemológicos), enfrenta um tema importante que revela uma série de perspectivas que apontam para uma nova visão da unidade das ciências. Com efeito, as importantes descobertas e os progressos dos últimos anos convidam-nos a examinar a grande analogia entre física e biologia, que se manifesta claramente sempre que obtemos uma compreensão mais profunda da ordem natural. Se é verdade que alguns dos novos conceitos obtidos deste modo podem permitir que tiremos conclusões sobre os processos do passado, esta extrapolação realça também a grande unidade da natureza na complexa estrutura do universo e o mistério do lugar que o homem ocupa nele. A complexidade e a grandeza da ciência contemporânea em tudo o que consente que o homem saiba sobre a natureza têm repercussões directas sobre os seres humanos. Só o homem pode ampliar constantemente o próprio conhecimento da verdade e ordená-la sabiamente para o bem próprio e do seu contexto.

Nos vossos debates tentastes examinar, por um lado, a dialéctica em curso sobre a expansão constante da pesquisa científica, dos métodos e das especializações e, por outro, a busca de uma visão global deste universo no qual os seres humanos, dotados de inteligência e liberdade, são chamados a compreender, amar, viver e trabalhar. Actualmente, a disponibilidade de instrumentos poderosos de pesquisa e o potencial para realizar experiências altamente complexas e precisas permitiram que as ciências naturais se aproximassem dos próprios fundamentos da realidade material, mesmo sem conseguir compreender totalmente a sua estrutura unificadora e a sua realidade última. A sucessão infinita e a integração paciente de diversas teorias, onde os resultados obtidos servem, por sua vez, como pressuposto para novas pesquisas, confirmam quer a unidade do processo científico quer o impulso constante dos cientistas em direcção a uma compreensão mais apropriada da verdade da natureza e de uma visão mais inclusiva da mesma. Podemos pensar aqui, por exemplo, nos esforços da ciência e da tecnologia para reduzir as diversas formas de energia a uma força elementar fundamental, que agora parece ser expressa melhor na abordagem emergente da complexidade como base para modelos explicativos. Se esta força fundamental já não parece ser tão simples, isso desafia os pesquisadores a elaborar uma formulação mais ampla, capaz de abranger tanto os sistemas mais simples quanto os mais complexos.

Esta abordagem interdisciplinar da complexidade demonstra inclusive que as ciências não são mundos intelectuais separados uns dos outros e da realidade, mas ao contrário estão interligados e orientados para o estudo da natureza como realidade unificada, inteligível e harmoniosa na sua indubitável complexidade. Esta visão tem pontos de encontro fecundos com a visão do universo adoptada pela filosofia e pela teologia cristãs, com a noção de ser participado, no qual cada criatura, dotada da própria perfeição, participa também numa natureza específica, e isto no seio de um universo ordenado que tem origem na Palavra criadora de Deus. É precisamente esta organização intrínseca «lógica» e «analógica» da natureza que incentiva a pesquisa científica e leva a mente humana a descobrir a comparticipação horizontal entre os seres e a participação transcendente da parte do Primeiro Ser. O universo não é caos ou resultado do caos, mas parece cada vez mais claramente uma complexidade organizada que nos permite elevar-nos, através da análise comparativa e da analogia, da especialização para um ponto de vista mais universalizante e vice-versa. Enquanto os primeiros instantes do cosmos e da vida eludem ainda a observação científica, a ciência reflecte sobre um grande número de processos que revela uma ordem de constantes e correspondências evidentes e serve como componente essencial da criação permanente.

É neste contexto mais amplo que gostaria de observar quanto se demonstrou fecundo o uso da analogia na filosofia e na teologia, não só como instrumento de análise horizontal das realidades da natureza, mas também como estímulo para a reflexão criativa num plano transcendente mais elevado. Precisamente graças ao conceito da criação o pensamento cristão utilizou a analogia não só para investigar a realidade terrena, mas também como meio para passar da ordem criada à contemplação do seu Criador, com a devida consideração do princípio segundo o qual a transcendência de Deus implica que cada semelhança com as suas criaturas necessariamente comporta uma maior dessimilaridade: enquanto a criatura é estruturalmente um ser por participação, Deus é um ser por essência, ou Esse subsistens. No grande empreendimento humano de tentar trazer à luz os mistérios do homem e do universo, estou convicto da necessidade urgente de diálogo constante e de cooperação ente os mundos da ciência e da fé para edificar uma cultura de respeito da dignidade e liberdade do homem, do futuro da nossa família humana e do desenvolvimento sustentável a longo prazo do nosso planeta. Sem esta interacção necessária, as grandes questões da humanidade deixam o âmbito da razão e da verdade, e são abandonadas ao irracional, ao mito ou à indiferença, com grande desvantagem para a humanidade, para a paz no mundo e para o nosso destino último.

Queridos amigos, ao concluir estas reflexões, gostaria de chamar a vossa atenção para o Ano da fé que a Igreja está a celebrar para comemorar o cinquentenário do concílio Vaticano II. Agradecendo-vos pelo contributo específico da Academia para o fortalecimento da relação entre razão e fé, garanto-vos o meu interesse profundo pelas vossas actividades e as minhas orações por vós e vossas famílias. Invoco sobre todos as bênçãos de Deus Todo-Poderoso da sabedoria, da alegria e da paz.

 



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