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CARTA DO PAPA JOÃO PAULO II
 POR OCASIÃO DO IX CENTENÁRIO DO RECONHECIMENTO CANÓNICO DA SANTIDADE DE ANDRÉ ZOERARD

 

Aos meus Veneráveis Irmãos
Jerszy ABLEWICZ, Bispo de Tarnow,
Jair PASZTOR, Bispo de Nitra,
József  CSERHÁTI, Bispo de Pécs

Aquilo que já os sábios antigos pensaram, a saber, que nenhum homem nasce só para si mesmo, mas também para os outros, é ainda mais verdadeiro a respeito dos Santos que são enviados por Deus para responderem perfeitamente a esta lei natural, confirmada pelo Evangelho, e assim, como luzeiros, indiquem aos outros esta via e a iluminem. Muitos destes tiveram nos seus países grande influência, seja porque os formaram em Cristo, seja porque de vários modos deixaram vestígios nas suas obras. Sem dúvida deve-se nomear entre estes André Zoerard, que ainda hoje é conhecido, admirado e venerado com piedade na Polónia, Checoslováquia e Hungria.

Este ano assinala o nono centenário do reconhecimento da sua santidade, e este acontecimento será comemorado em Julho próximo com as devidas solenidades; e é com alegria que, mediante esta Carta, chamo a atenção dos cristãos para este homem a quem tantos méritos deve a Igreja e a sociedade. Ao assim agir, não faço senão seguir o exemplo do meu predecessor Gregório VII que, em 1083, a pedido de Vladislau, rei da Hungria, aprovou o culto de André Zoerard: culto anunciado na presença do Legado do Soberano Pontífice, após o exame do Sínodo Húngaro.

Zoerard nasceu na Polónia, em 980, de uma família de humildes camponeses: ele foi chamado por Deus a viver na solidão para poder estar mais atento à Sua voz, segundo as palavras do profeta Oséias: "Conduzi-la-ei ao deserto e falar-lhe-ei ao coração" (Os. 2, 16), tendo se alojado em Tropje nos limites da diocese de Cracóvia, e ali construiu um ermitério entre o final do século X e o início do século XI; deixou-o em 1022 e entrou no mosteiro beneditino de Santo Hipólito, no monte Zobor, na Eslováquia, para se dedicar à vida monástica, tomando o nome religioso de André. Em seguida, com mais ou menos quarenta anos, retirou-se para uma gruta perto de Skalka, às margens do rio Wag, e retomou a vida eremítica, da qual já antes fizera experiência na Polónia. Tão grande foi a sua penitência, que durante o dia mortificava o próprio corpo e à noite passava em vigília de oração, estendido sobre um tronco de carvalho recoberto de espinhos e aguilhões para não ceder ao sono; durante a Quaresma alimentava-se diariamente apenas com uma noz, embora muitas vezes viesse a desfalecer de fome. Após a morte foi encontrado no seu corpo um cilício feito com uma cadeia de ferro, profundamente ligada à sua carne. Ele , morreu por volta de 1034 e foi sepultado em Nitra, na basílica de Santo Emerão; muitos milagres obtidos junto do seu túmulo por aqueles que oravam, demonstraram claramente a sua santidade

Santo André Zoerard foi um homem todo entregue a Deus. Neste ano do Jubileu extraordinário da Redenção do género humano, durante o qual ocorre o nono centenário do reconhecimento da sua santidade, é-me grato sublinhar que ele realizou de maneira perfeita o apelo expresso no início da Carta Apostólica pela qual desejei recordar aos cristãos a memória deste importante acontecimento: "Abri as portas ao Redentor". Com efeito, ele abriu as suas portas a Cristo e esforçou-se sem cessar, ímitando-O, por obter aquilo que é o objectivo de todos os Santos e que o Apóstolo Paulo disse de si mesmo: "Eu vivo, mas já não sou eu, é Cristo que vive em mim" (Gál. 2, 20); e além disso, ele abriu ao Redentor as portas das nações acima referidas, sem dúvida mais pelas suas orações, vida mística e penitência diante das dificuldades, e pelo trabalho das suas mãos que pela sua palavra. Por este método extremamente eficaz, ele foi ao mesmo tempo anunciador de Cristo e benfeitor do próximo; foi assim que ele' Consolidou as bases da religião cristã naquelas regiões e semeou os rudimentos de uma cultura social e cívica. Esta civilização, de raiz cristã e romana, comum no resto da Europa, ele transmitiu aos povos eslavos; e de igual modo, continuando a obra dos Santos-Cirilo e Metódio, uniu mais estreitamente estes povos entre si e com toda a Europa, fazendo que partilhassem as suas culturas e talentos. Por isso, juntamente com S. Bento e estes dois apóstolos eslavos, de certo modo, ele participou na honra de ter contribuído para edificar a nova Europa.

As celebrações realizadas em 1966, em Tropje, para comemorar o milénio da conversão da Polónia a Cristo, salientaram os méritos de Santo André Zoerard. Eu estive presente naquelas festas como Arcebispo Metropolita de Cracóvia, pronunciei um discurso referindo-me aos seus méritos; disse então, em substância, que Santo André Zoerard, pela sua vida, suas orações e ascese, e por tudo o que fizera em favor dos seus irmãos a fim de conseguir a unidade dos clãs, estava na origem deste vigor dos mil anos de vida cristã na Polónia.

Em razão do seu vínculo estreito com a diocese de Tarnow, onde ele iniciou a vida eremítica e é o centro principal do seu culto, pois lá se encontram as suas relíquias, e ali está edificado o ermitério e um santuário a ele dedicado, Santo André Zoerard foi escolhido, juntamente com o mártir S. Bento que foi seu discípulo, como padroeiro secundário daquela diocese. Os fiéis podem ganhar a indulgência do Jubileu extraordinário na sua igreja. De igual modo, devido aos semelhantes vínculos que os unem, estes dois Santos foram nomeados Padroeiros principais da diocese de Nitra e pelo povo são tidos em grande honra.

Enfim, Santo André Zoerard foi proclamado no final do século XIX Padroeiro da juventude Eslovaca, constituindo isto um sinal singular do seu renome e da veneração que lhe é devida.

As celebrações que vão realizar-se, mostrarão ainda com mais evidência que, após nove séculos da sua elevação às honras devidas aos santos, Santo André Zoerard continua a viver na mente e no coração dos Polacos, dos Eslovacos, dos habitantes da Boémia e dos Húngaros, que mais se beneficiaram da sua santidade; mas nada impede que de igual modo todo o povo cristão possa muito aprender. Em particular, pelo seu desprezo das coisas materiais, ele recorda a nós contemporâneos, tão inclinados ao prazer e aos bens efémeros desta terra, que Deus é o único Bem, o Supremo Bem, que deve ser procurado com todo o nosso coração, com toda a nossa alma e com todas as nossas forças, por nós que somos peregrinos na terra, pois "não temos aqui cidade permanente, mas vamos em busca da futura" (Heb. 13, 14); ele recorda-nos depois que é preciso servir o próximo, não apenas mediante as obras exteriores de caridade mas ainda com o testemunho do Evangelho, conforme as palavras de Nosso Senhor Jesus Cristo a todos os seus discípulos: "Vós sois o sal da terra... Vós sois a luz do mundo... que a vossa luz brilhe diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai que está nos céus" (Mt. 5, 13.14.16). A vida e o exemplo de Santo André Zoerard valem para todos; mas em primeiro lugar para aqueles que se consagraram a Deus retirando-se a uma vida religiosa. Estes aprenderão dele que a solidão não deve separá-los de todo o corpo da Igreja mas, antes, devem, pelas suas orações, penitências e virtudes, e pelo seu amor a Deus, ser membros do Corpo Místico de tal sorte que, mediante eles, um sangue mais são e mais vigoroso circule para o bem de todos os membros.

De todo o coração, Veneráveis Irmãos, desejo então unir-me a vós nestas solenidades do nono centenário do reconhecimento pela Igreja da santidade de André Zoerard, e rejubilar-me convosco porque Deus concedeu aos vossos países uma tão grande testemunha da fé católica que é hoje o seu Padroeiro no céu. E na firme confiança que o Povo de Deus haurirá destas solenidades uma regra de vida e de conduta, concedo-vos com todo o afecto, a vós, aos vossos colaboradores, sacerdotes, religiosos e a todos os fiéis confiados ao vosso ministério, a minha Bênção Apostólica.

Do Vaticano, no dia 30 de Abril de 1983, quinto ano de Pontificado.

 

JOÃO PAULO PP. II

 

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