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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
 NO FINAL DO CONCERTO OFERECIDO
 PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA ITALIANA
 POR OCASIÃO DO SEXTO ANIVERSÁRIO
DE INÍCIO DE PONTIFICADO

Sala Paulo VI
Quinta-feira, 5 de Maio de 2011

 

Senhor Presidente da República
Senhores Cardeais
Excelentíssimos Ministros e Autoridades
Venerados Irmãos no Episcopado
e no Presbiterado
Gentis Senhores e Senhoras!

Também este ano, com a habitual e requintada cortesia, o Presidente da República Italiana, Excelentíssimo Senhor Giorgio Napolitano, quis proporcionar-nos um momento de elevação musical pelo aniversário do início do meu Pontificado. Enquanto o saúdo, com deferência, Senhor Presidente, juntamente com a sua gentil Senhora, expresso vivo agradecimento por esta agradável homenagem e pelas cordiais palavras que me dirigiu, manifestando também a proximidade do querido povo italiano ao Bispo de Roma e recordando o inesquecível momento da beatificação de João Paulo II. Saúdo as demais Autoridades do Estado italiano, os Senhores Embaixadores, as várias Personalidades, a Câmara Municipal de Roma e todos vós. Dirijo um agradecimento especial ao Maestro, aos Solistas, à Orquestra e ao Coro do Teatro da Ópera de Roma pela maravilhosa execução das duas obras-primas de António Vivaldi e de Joaquim Rossini, sumos compositores dos quais a Itália, que celebra 150 anos de unificação política, deve orgulhar-se. Obrigado também a quantos tornaram possível este evento.

«Creio», «Amém»: são as duas palavras com as quais inicia e se conclui o «Credo», a «Profissão de fé» da Igreja, que escutámos. O que significa creio? É uma palavra que tem vários significados: indica acolher algo dentro das próprias convicções, confiar em alguém, ter certeza. No entanto, quando a pronunciamos no «Credo» assume um significado mais profundo: é afirmar com confiança o sentido verdadeiro da realidade que nos apoia e sustenta o mundo; significa acolher este sentido como o terreno sólido sobre o qual podemos estar sem temor; é saber que o fundamento de tudo, de nós mesmos, não pode ser realizado por nós, mas só ser recebido. E a fé cristã não diz «creio em algo», mas «creio em Alguém», no Deus que se revelou em Jesus, n’Ele compreendo o autêntico sentido do mundo; e este crer abrange toda a pessoa, que está a caminho rumo a Ele. Depois, a palavra «amém», que em hebraico tem a mesma raiz da palavra «fé», retoma o conceito idêntico: o apoiar-se confiante numa base sólida, Deus.

Pensemos no trecho de Vivaldi, grande representante do século XVII veneziano. Infelizmente, conhece-se pouco da sua música sacra, que encerra tesouros preciosos: tivemos um exemplo disto na peça desta noite, provavelmente composta em 1715. Gostaria de fazer três observações. Primeiramente, um facto anómalo na produção vocal vivaldiana: a ausência de solistas, há só o coro. Deste modo, Vivaldi quer expressar o «nós» da fé. O «Credo» é o «nós» da Igreja que canta a sua fé, no espaço e no tempo, como comunidade de crentes; o «meu» afirmar «creio» está inserido no «nós» da comunidade. Depois, gostaria de relevar os dois maravilhosos quadros centrais: Et incarnatus est e Crucifixus. Vivaldi detém-se, como era comum, no momento no qual Deus, que parecia estar distante, se aproxima, se encarna e se doa a si mesmo na Cruz. Aqui a repetição das palavras, as modulações contínuas exprimem o sentido profundo da admiração diante deste Mistério e exortam-nos à meditação, à oração. Uma última observação. Carlos Goldoni, grande representante do teatro veneziano, no seu primeiro encontro com Vivaldi notava: «Encontrei-o circundado de música e com o breviário nas mãos». Vivaldi era sacerdote e a sua música nasce da sua fé.

A segunda obra-prima desta noite, o «Stabat Mater» de Joaquim Rossini, é uma grande meditação sobre o mistério da morte de Jesus e da dor profunda de Maria. Rossini tinha concluído a fase operística da sua carreira com apenas 37 anos, em 1829, com Guilherme Tell. A partir daquele momento deixou de compor peças de grandes proporções, apenas com duas excepções, ambas de música sacra: «Stabat Mater» e «Petite Messe Solennelle». A religiosidade de Rossini exprime uma rica variedade de sentimentos diante dos mistérios de Cristo, com uma forte tensão emotiva. Do grande afresco inicial do «Stabat Mater», angustiado e afectuoso, aos trechos dos quais emerge a cantabilidade rossiniana e italiana, mas sempre cheia de tensão dramática, até à dupla fuga final com o poderoso Amen, que expressa a firmeza da fé, e o In sempiterna saecula, que parece querer explicar o sentindo da eternidade. Mas penso que as pérolas verdadeiras desta obra são os dois trechos «a cappella», o Eja mater fons amoris e o Quando corpus morietur. Aqui o Maestro volta à lição da grande polifonia, com uma intensidade emotiva que se transforma em oração fervorosa: «Quando o meu corpo morrer, faz com que à alma seja dada a glória do Paraíso». Rossini, com 71 anos, após ter composto a «Petite Messe Solennelle», escrevia: «Bom Deus, eis concluída esta pobre Missa... sabes bem que nasci para a ópera bufa! Pouca ciência, um pouco de coração e basta. Portanto, sê misericordioso e c0ncede-me o paraíso». Uma fé simples e genuína.

Queridos amigos, espero que os trechos desta noite tenham alimentado também a nossa fé. Ao Senhor Presidente da República italiana, aos solistas, às estruturas do Teatro da Ópera de Roma, ao maestro, aos organizadores e a todos os presentes renovo a minha gratidão e peço uma recordação na oração pelo meu ministério na vinha do Senhor. Que Ele continue a abençoar a vós e os vossos entes queridos. Obrigado.

 

 



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