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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

Raízes secas

Terça-feira, 28 de março de 2017

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 14 de 6 de abril de 2017

Existe um pecado que «paralisa» o coração do homem, fazendo-o «viver na tristeza» e «esquecer a alegria». Trata-se da «preguiça», aquele comportamento que leva as pessoas a ser como árvores com «raízes secas» e a «não ter vontade de ir em frente». Para elas a palavra de Jesus é como um choque: «levanta-te!», pega a tua vida nas mãos e «vai em frente!». Toda a meditação do Pontífice, seguindo a liturgia do dia, foi acompanhada por um dos símbolos mais importantes e recorrentes na Bíblia, a água. De facto, na primeira leitura Ezequiel (47, 1-9.12) «fala-nos da água que saía do templo de Deus, uma água bendita». Trata-se, especificou o Papa, de «um riacho com muita água». Uma água «saneadora». O profeta descreve «muitas árvores verdes, bonitas» que cresciam «próximas daquela água»: claramente são um símbolo para significar «a graça, o amor, a bênção de Deus». Com efeito, essas árvores «eram verdes, viçosas, não secas». E se compararmos estas palavras com as do salmo 1 — «Feliz o justo porque será como uma árvore que cresce ao longo dos cursos de água» — compreendemos imediatamente a simbologia aplicada à «pessoa justa e boa».

Também no Evangelho de João (5, 1-16), observou o Pontífice, é evocada a água. A do tanque de Betesda, uma piscina «com cinco portais sob os quais descansavam um grande número de enfermos, cegos, coxos, paralíticos». Segundo a tradição, explicou Francisco, de vez em quando descia um anjo do céu para mover as águas e as primeiras pessoas que naquele momento se lançavam eram curadas. Portanto, estas pessoas estavam sempre à espera, «pedindo a cura».

Entre elas havia um paralítico que esperava ali há 38 anos. E Jesus, «que conhecia o coração daquele homem» e sabia que há muito tempo estava naquelas condições, «disse-lhe: “Queres sarar?”». Antes de tudo, observou o Papa, é preciso notar como é «bom» que Jesus diga ao paralítico e, através dele, também aos homens do nosso tempo: «Queres sarar? Queres ser feliz? Queres melhorar a tua vida? Queres ser pleno do Espírito Santo? Queres sarar?».

Diante de uma pergunta deste tipo, prosseguiu Francisco, «todos os outros que estavam lá, enfermos, cegos, coxos, paralíticos teriam respondido: “Sim, Senhor, sim!”». Mas aquele parecia «um homem estranho» e «respondeu a Jesus: “Senhor, não tenho alguém que me ponha na piscina quando a água se agita; de facto, quando estou para entrar na água outro desce antes de mim”». A sua resposta «é uma reclamação: “Mas, olha, Senhor, quão difícil e injusta a vida foi comigo. Todos podem entrar e sarar e eu há 38 anos que procuro, mas...”».

Explicou o Pontífice: «Esse homem era como a árvore, estava perto da água mas tinha as raízes secas que não chegavam até à água, não podiam absorver a saúde da água». Uma realidade que «se compreende pelo comportamento, pelas reclamações» e através do seu procurar sempre «dar a culpa ao outro: “Mas são os outros que vão antes de mim, sou um pobrezinho que estou aqui há 38 anos...”».

Aqui parece bem descrito «o pecado da preguiça», um «pecado terrível». Esse homem, disse o Papa, «estava doente não tanto pela paralisia mas pela preguiça, o que é pior que ter o coração tíbio, muito pior». A preguiça, continuou, é aquele viver por viver, é «não ter vontade de prosseguir, de fazer algo na vida»: é «ter perdido a memória da alegria». «Esse homem não conhecia a alegria nem sequer de nome, perdeu-a».

Trata-se, afirmou o Pontífice, de uma «doença horrível» que leva a esconder-se por detrás de justificações do tipo: «Mas é cómodo assim, estou acostumado... Mas a vida foi injusta comigo...». Assim, por detrás das palavras do paralítico, «vê-se o ressentimento, a amargura daquele coração». E no entanto «Jesus não o repreende», olha para ele e diz-lhe: «Levanta-te, toma o teu leito e anda». E ele pega o leito e vai.

A narração evangélica continua, especificando que isto aconteceu no sábado e que o homem encontrou os doutores da lei que lhe objetaram: «Mas não te é permitido porque o código diz que no sábado não se pode fazer isto. Quem te curou?». Referindo-se a Jesus continuavam: «Não, pois vai contra o código, aquele homem não é de Deus». Diante desta cena o Papa traçou um breve perfil daquele homem, uma pessoa que «não sabia como se arranjar na vida» e que a Jesus «nem sequer agradeceu». Nem lhe perguntou o nome. Simplesmente «levantou-se com a preguiça» que o distinguia e foi embora. Uma separação que mostra mais uma vez como a preguiça é «um pecado terrível».

Qualquer homem, explicou o Papa, pode cometer este pecado: é «viver porque é grátis o oxigénio, o ar», «é viver sempre olhando para os outros que são mais felizes do que eu, viver na tristeza, esquecer a alegria». É, enfim, «um pecado que paralisa, tornando-nos paralíticos. Não nos deixa caminhar». E também a nós Jesus diz hoje: «Levanta-te, pega a tua vida como é, boa ou difícil, e vai em frente. Não tenhas medo, vai em frente com o teu leito — “Mas, Senhor, não é o último modelo...” — Mas vai em frente! Com o leito feio, talvez, mas vai! É a tua vida, é a tua alegria».

A primeira pergunta que o Senhor faz a todos, hoje, é: «Queres sarar?». E se a resposta for «Sim, Senhor», Jesus exorta: «Levanta-te!». Portanto, concluiu o Pontífice evocando a antífona da missa («”Vós que tendes sede vinde até às águas — são águas gratuitas, não mediante pagamento — dessedentai-vos com alegria”»), se «dissermos ao Senhor: “Sim, quero sarar. Sim, Senhor, ajudai-me pois quero levantar-me”, conheceremos a alegria da salvação».

 



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