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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA
NA CAPELA DA CASA SANTA MARTA

Rígido mas pelo menos honesto

Sexta-feira, 5 de maio de 2017

 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 19 de 11 de maio de 2017

Uma oração pelos cristãos «hipócritas» que hoje, com a sua «vida dupla» estão cegos pela rigidez, cobrindo «pecados e doenças de personalidade» a ponto de não ter consideração por ninguém, nem sequer pelas crianças: eis o pedido do Papa Francisco na missa desta manhã. Com um pensamento também por quantos na Igreja — sobretudo jovens — caíram na «tentação da rigidez» mas, mesmo errando, são «honestos». «O Senhor — foram os seus votos — os ajude a crescer pelo caminho da mansidão».

A meditação de Francisco começou pelo «trecho da Bíblia», tirado do livro dos Atos dos Apóstolos (9, 1-20), proposto pela liturgia do dia e que «ouvimos muitas vezes». E, talvez comentando-o «ao pensar no que aconteceu a Saulo, muitas vezes dissemos a alguém “a este faria bem cair do cavalo”».

«A primeira vez que aparece o nome de Saulo é na lapidação de Estêvão». Saulo «era um jovem rígido, idealista, com a rigidez da lei que tinha aprendido na escola de Gamaliel». E «estava convencido disto: por isso estava ali, olhando como Estêvão — que, segundo ele, tinha pecado de blasfémia — era lapidado». E «aprovava a lapidação, diz o livro».

Saulo, «este jovem rígido, era honesto: com aquela rigidez — errada! — mas honesto». Em síntese, «ele acreditava e agia». Mas, acrescentou o Papa, muitas «vezes Jesus teve que condenar os rígidos que não eram honestos». E «sobre aqueles doutores da lei diz-nos “fazei o que dizem, mas não o que fazem”». Com efeito, insistiu, há «os rígidos com vida dupla: mostram-se belos, honestos, mas quando ninguém os vê fazem coisas más».

Contudo, não é este o modo de ser de Saulo: «Este jovem era honesto: acreditava sinceramente». E, confidenciou Francisco, «penso, quando digo isto, em tantos jovens que caíram na tentação da rigidez, hoje, na Igreja: alguns são honestos, são bondosos, devemos rezar para que o Senhor os ajude a crescer pelo caminho da mansidão». Certamente, «há quem usa a rigidez para encobrir debilidades, pecados, doenças de personalidade e usam a rigidez para prevalecer sobre os outros».

Crescendo, Saulo era sempre «honesto, rígido» e «tinha o zelo pela lei: inspirava ameaças e massacres contra os discípulos do Senhor». De resto, para ele aquilo que os apóstolos pregavam era «uma heresia» que não se podia «tolerar». E assim «foi ter com o sumo sacerdote» pedindo, «lê-se nos Atos dos Apóstolos, «cartas para as sinagogas de Damasco, a fim de ser autorizado a levar em cadeias para Jerusalém todos aqueles que tivesse encontrado, homens e mulheres, pertencentes a este Caminho». Mas Saulo «pelo menos deixava as crianças vivas: hoje, nem sequer isto!».

Portanto, afirmou Francisco, Saulo «foi com este zelo a Damasco aprisionar os cristãos para os levar em cadeias para serem julgados e, se fosse necessário, até lapidados». Eis então que «se dá ali o encontro daquele homem que inspira ameaças e massacres com outro homem que fala com uma linguagem de mansidão: “Saulo, Saulo, por que me persegues?”». E ele perguntou imediatamente: «Quem és, Senhor?». Sempre «com mansidão», eis a resposta: «Eu sou Jesus, que tu persegues! Levanta-te, entra na cidade e ser-te-á dito o que deves fazer».

Assim «o jovem rígido que se tornou homem rígido — mas honesto! — fez-se criança» deixando-se «levar onde o Senhor o chamou»: é «a força da mansidão do Senhor». Saulo, «tendo permanecido cego depois desta visão», foi guiado «pela mão até Damasco». Por ser «honesto não se lamentou: permanecia em silêncio». E «dado que conhecia a lei, sabia que o caminho era a oração e o jejum e durante três dias rezou e jejuou: cego, na escuridão, esperando».

Depois entra em cena o «idoso Ananias, que se lamenta um pouco» com o Senhor porque ouviu dizer o que Saulo fez aos cristãos em Jerusalém. Mas o mandato do Senhor a Ananias é claro: «Vai, porque ele é o instrumento que escolhi para mim, a fim de que leve o meu nome diante das nações, dos reis e dos filhos de Israel; e eu mostrar-lhe-ei quanto deverá sofrer pelo meu nome».

«Jesus — comentou Francisco — não diz a Paulo “vem comigo, eu te farei rei, dar-te-ei o poder”». Ao contrário, diz-lhe: «tu sofrerás» e «Paulo aceita». Portanto «a força da graça do Senhor e a honestidade de Paulo encontraram-se». E «assim este homem, a partir da própria experiência, prega aos outros, de uma parte à outra: perseguido, com tantos problemas, até na Igreja, teve que sofrer porque os cristãos discutiam entre si». Mas «ele, que tinha perseguido o Senhor com o zelo da lei, dirá aos cristãos: do mesmo modo como vos afastastes do Senhor, pecastes, com a mente, com o corpo, com tudo, com os próprios membros agora sede perfeitos, glorificai a Deus».

Em síntese, «há o diálogo entre a suficiência, a rigidez e a mansidão» explicou o Pontífice. Ou seja, «o diálogo entre um homem honesto e Jesus que lhe fala com doçura: começa assim a história deste homem que conhecemos quando era jovem, na lapidação de Estêvão, e que será traído». Talvez «para alguns, a vida deste homem seja uma “falência”: olha o fim que levou!». Até porque «para alguns» também «a vida de Jesus é uma “falência”» ao ver que «fim levou». Mas «este é o caminho do cristão: ir em frente seguindo os vestígios que Jesus deixou, da pregação, do sofrimento, da cruz, da ressurreição». E precisamente à intercessão de Saulo o Papa confiou «hoje, de maneira especial, os rígidos que há na Igreja», quer «os rígidos honestos como ele, que têm zelo, mas erram», quer os «rígidos hipócritas, os de vida dupla, aqueles aos quais Jesus dizia “fazei o que dizem, não o que fazem”». Por isso, concluiu, hoje «rezemos pelos rígidos».

 



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