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DISCURSO DO SANTO PADRE AO NOVO
 EMBAIXADOR DA FRANÇA
JUNTO À SANTA SÉ

Sábado, 10 de Junho de 2000

Senhor Embaixador

1. É com prazer que dou as boas-vindas a Vossa Excelência no momento da apresentação das Cartas que o acreditam como Embaixador da França junto da Santa Sé.

Ao dirigir-me as palavras que muito me sensibilizaram, Vossa Excelência manifesta a confiança que caracteriza as relações do seu País com a Santa Sé. Agradeço-lhe ter-se feito intérprete de Sua Excelência o Senhor Presidente da República Francesa, e ficar-lhe-ia grato se se dignasse transmitir-lhe as minhas deferentes saudações. Desejo saudar todos os seus compatriotas, sobretudo os que vivem provações pessoais, familiares ou sociais. De modo particular, não me esqueço dos numerosos lares e empresas que ainda sofrem devido às catástrofes que atingiram o território nacional durante o último Inverno. Tenham todos a certeza da minha proximidade espiritual! Através de Vossa Excelência, desejo ainda dirigir uma saudação cordial e afectuosa aos pastores e aos fiéis da comunidade católica do seu País. Com os olhos voltados para o próximo Dia Mundial da Juventude, recordo-me dos esforços que eles despenderam no precedente encontro, que deu numerosos frutos; encorajo-os a prosseguir a sua missão espiritual e o seu empenho na sociedade, por amor dos seus irmãos. Desta forma, eles serão reconhecidos como servidores de todos, no amor que é a característica dos discípulos de Cristo.

2. Daqui a algumas semanas, por um período de seis meses, o seu País assumirá a presidência da União Europeia, neste ano em que recordamos o cinquentenário da proclamação do acto político de 9 de Maio de 1950 que, querido por Jean Monnet e Robert Schuman, seus compatriotas, e por Konrad Adenauer, dava origem a uma nova situação europeia. Aprecio o espírito a que Vossa Excelência fez menção e com o qual as Autoridades francesas desejam cumprir a sua missão ao serviço da Europa. É tarefa do seu País prosseguir na direcção de empreendimentos difíceis, a fim de responder de maneira concreta às preocupações e à enorme expectativa não só dos habitantes do continente europeu mas também de todos os parceiros que, no mundo, precisam da sua ajuda para se desenvolver. A União Europeia é um objectivo e simultaneamente um desafio; ela abre o caminho a um futuro de paz e de solidariedade, e a colaborações cada vez mais intensas entre os diferentes países do continente e com o mundo inteiro. É fundamental que, a todos os níveis, as instituições e as pessoas eleitas para cargos de responsabilidade tenham continuamente a preocupação do bem comum do conjunto das nações, exercendo a sua missão como um serviço às populações, no respeito das regras de igualdade, justiça e honestidade, essenciais para todos os homens, e de maneira muito especial para quantos trabalham na res publica. Assim, podem-se impedir as redes ocultas, que querem aproveitar-se do grande mercado europeu para purificar o dinheiro de todos os géneros de tráfico indigno do homem, sobretudo no âmbito da droga, do comércio das armas e da exploração das pessoas, especialmente das mulheres e das crianças. Os recursos, as riquezas e os frutos do crescimento no continente devem destinar-se sobretudo aos mais pobres nos diferentes países, às nações que mais precisam de se desenvolver e que actualmente ainda estão marcadas pelas consequências da regressão económica e das flutuações dos mercados financeiros.

Estes desafios, aos quais se acrescenta a luta contra o desemprego e a protecção do meio ambiente, citando apenos alguns, supõem que a construção europeia não seja antes de tudo uma comunidade de interesse, mas uma comunidade fundada em valores e na confiança recíproca, situando o homem no centro de todas as lutas. Todas as forças vivas das nações são chamadas a colaborar para o bem de todos, tendo a solicitude de formar, nos diferentes países, a jovem geração, com ideais nobres como ela demonstrou em Paris durante o último Dia Mundial da Juventude, a fim de ser capaz, quando chegar o momento, de assumir as suas responsabilidades. Neste espírito, os países com uma tradição de formação para a gestão dos negócios e para a vida cívica têm o dever de propor uma assistência às nações que acabam de sair dum longo período de estagnação, a fim de ajudar os cidadãos a adquirirem uma maturidade política indispensável à vida pública. De igual modo, é importante promover cada vez mais entre os nossos contemporâneos uma consciência europeia que, tendo em consideração as origens dos povos, os mobilize para que constituam uma comunidade de destino, graças a uma vontade política que se empenha em unir os povos. Uma perspectiva como esta não se poderá realizar a não ser privilegiando uma visão global do homem e da sociedade, da qual o seu País pode ser um dos promotores, baseando-se na sua tradição, sobretudo nos grandes pensadores e nos dirigentes da vida social, que se distinguiram no século XX e insuflaram um espírito novo, contribuindo para a criação duma cultura comum.

3. Vossa Excelência acaba de mencionar a questão dos direitos do homem, à qual os seus compatriotas são muito sensíveis, manifestando assim a sua atenção a quanto é essencial para as pessoas e para a comunidade nacional. De facto, os direitos do homem são o fundamento do reconhecimento do ser humano e da unidade social. Cabe em primeiro lugar às instituições públicas garantir "uma protecção eficaz dos direitos que promanam imediatamente da sua dignidade de pessoa, e que são, por isso mesmo, direitos universais, invioláveis e inalienáveis" (João XXIII, Encíclica Pacem in terris, IV, 145). Entre estes direitos, o direito à existência e ao respeito da vida é primordial, bem como o apoio à família, célula básica da sociedade. O prolongamento da vida exige que seja dada uma atenção especial às pessoas idosas, para que possam viver em condições decentes e beneficiar até ao termo natural da sua existência dos cuidados e da assistência necessários. Com efeito, como podem os indivíduos no seio duma nação ter confiança uns nos outros, se não lhes é garantido o bem mais precioso de cada um, a sua própria vida, que não pode ser submetida unicamente a critérios de eficácia e de rentabilidade, ou a decisões meramente arbitrárias? É dever dos países, em nome dos direitos do homem, e uma honra para as suas instituições, apoiar e defender todos os seres humanos contra tudo o que injuria a sua dignidade e os seus direitos, e proporcionar as ajudas espirituais, humanas e materiais, a fim de que a existência de cada um seja bela e digna, e ninguém se marginalize. Nesta perspectiva, conheço o empenho dos seus compatriotas pela defesa da dignidade das crianças. Numerosas associações se orientam nesta direcção. Não posso deixar de as encorajar a prosseguir a sua acção, sobretudo para que cada criança possa nascer, ter uma família, um pai e uma mãe que possam ajudá-la a construir-se pessoalmente e a estabelecer relações humanas equilibradas e equilibrantes, e a não estar submetida a uma exploração vergonhosa.

4. É importante que a juventude desenvolva a formação e a educação num contexto que permita o desabrochar da sua personalidade. Desejo estimular a acção dos professores, dos educadores e dos serviços sociais, que se empenham com paciência e tenacidade a fim de orientar os jovens e criar as condições para que o ensino possa ser acessível a todos e para combater os males que afligem a sociedade moderna, tais como a violência e a droga. É um serviço fundamental à nação, para o qual todas as instituições educativas devem contribuir. Vossa Excelência está ao par da acção que a Igreja na França desempenha neste âmbito desde há muito tempo, em sintonia com todos os parceiros do mundo da educação, num diálogo confiante e numa estima recíproca, preocupando-se primariamente por servir as pessoas e a comunidade nacional, contribuindo com a sua especificidade e as suas características próprias, e recebendo as garantias e o apoio necessários para a realização desta tarefa de interesse nacional. Ela deseja ardentemente prosseguir esta missão, no respeito das suas convicções, para dar aos jovens e às famílias que o desejam tanto um ensino de qualidade como perspectivas filosóficas, teológicas e espirituais que correspondam à sua visão do homem e ao ensino do Magistério, no respeito das regras próprias da laicidade que, no seu País, conferem uma influência jurídica ao serviço da educação e da liberdade, permitindo uma autonomia das realidades terrestres e deixando às confissões religiosas a faculdade de realizar a sua missão. A lei francesa garante também esta liberdade, oferecendo às famílias a possibilidade de dar às suas crianças uma educação religiosa, mediante horas a ela destinadas propositadamente no arco do ensino escolar; é necessário que todos estejam atentos a fazer de maneira que as eventuais mudanças do programa escolar englobem este aspecto, de acordo com as leis em vigor, respeitando os horários e os ritmos das crianças e das suas famílias.

Uma perspectiva como esta rende justiça a que a educação não seja simplesmente a aprendizagem dum saber científico e técnico, mas também a transmissão de habilidades, duma vivência e de valores fundados num progresso espiritual e moral, que fazem compreender o sentido da existência e, como Vossa Excelência ressaltou, pertencem ao património do seu País.

5. Como recordei várias vezes, o primeiro dos direitos do homem é a liberdade religiosa, no sentido pleno do termo. Isto significa uma liberdade que não se limite unicamente à esfera privada. Esta liberdade supõe da parte das Autoridades e de toda a comunidade internacional, sobretudo da escola e da mídia, que tem uma importante função na formação da opinião, uma vontade expressa de deixar às pessoas e às instituições a possibilidade de desenvolver a sua vida religiosa, de transmitir as suas crenças e valores, e de serem uma parte activa nos diferentes âmbitos da vida social e na colectividade, sem serem excluídos por motivos religiosos ou filosóficos, salvaguardando as regras do Estado de direito. Injuriar as crenças religiosas, desacreditar determinadas formas de prática religiosa e os valores dos quais um grande número de pessoas são portadoras, danifica gravemente os indivíduos que os professam, constitui uma forma de exclusão contrária ao respeito dos valores humanos fundamentais e desestabiliza em grande medida a sociedade na qual deve subsistir uma determinada forma de pluralismo de pensamento e de acção, bem como uma atitude de benevolência fraterna. Isto causa um clima de tensão, de intolerância, de oposição e de suspeita, pouco propício à paz social. Por conseguinte, encorajo quantos têm responsabilidades na sociedade a continuar a vigiar sobre o respeito das liberdades individuais. Convido sobretudo os mass media a uma vigilância renovada neste âmbito e a tratar de maneira equitativa e objectiva as diferentes confissões religiosas.

6. Entre as numerosas tarefas que o esperam e que Vossa Excelência acaba de recordar, deverá prosseguir a obra empreendida pelo seu predecessor para o acolhimento dos peregrinos francófonos durante o Grande Jubileu e para o desenvolvimento e o dinamismo da comunidade francesa. A este propósito, desejo repetir-lhe quanto aprecio o interesse dedicado pela sua Embaixada à preparação do Dia Mundial da Juventude que se realizará no próximo mês de Agosto, agradecendo o que já foi feito para que os jovens possam aproveitar em grande medida este forte tempo espiritual e eclesial. Esta obra manifesta a atenção que as Autoridades do seu País dedicam à presença activa da França em Roma e no mundo, seguindo o exemplo dos seus compatriotas que, durante os séculos passados, foram agentes da difusão da cultura e da fé em todos os continentes.

No momento em que Vossa Excelência inicia oficialmente a sua missão, apresento-lhe, Senhor Embaixador, os meus votos mais calorosos. Posso garantir-lhe que os meus colaboradores se esforçarão por lhe dar, a Vossa Excelência e a todos os membros da sua Embaixada, a assistência da qual poderá precisar. Peço a Deus que ampare o povo francês, para que encontre o verdadeiro bem-estar e possa continuar a trabalhar com generosidade em benefício da paz e do entendimento entre os componentes da nação e entre os povos. Concedo-lhe de bom grado a Bênção apostólica, bem como aos seus familiares e a quantos são chamados a trabalhar com Vossa Excelência.

 

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