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PEREGRINAÇÃO JUBILAR  DO PAPA JOÃO PAULO II
À GRÉCIA, SÍRIA E MALTA
(4 - 9 DE MAIO DE 2001)

ENCONTRO COM OS PATRIARCAS E OS BISPOS DA SÍRIA

PALAVRAS DO SANTO PADRE

Residência Patriarcal Greco-Melquita
Damasco, 6 de Maio de 2001

 

Santidade
Beatitudes
Senhores Cardeais
Queridos Irmãos no Episcopado

1. A minha peregrinação seguindo os passos de São Paulo, estimados Irmãos, traz-me hoje à Síria, a Damasco, e é com grande alegria que me encontro entre vós. Agradeço-vos o vosso caloroso acolhimento e exprimo em particular a minha gratidão a Sua Beatitude o Patriarca Gregório III, pelas amáveis palavras de boas-vindas à sua residência patriarcal.

Todas as peregrinações são uma ocasião para voltar às fontes da nossa fé, confirmar o nosso amor a Cristo e à Igreja, e para nos lançarmos de novo na missão que Jesus nos confiou. Aqui, nesta terra abençoada por Deus devido à presença, no decurso dos séculos, de testemunhas eminentes que, na sua vida e nos seus escritos, são figuras da tradição de toda a Igreja, a história sagrada lê-se como um livro aberto na paisagem, nos lugares bíblicos e nos santuários cristãos. Mas esta peregrinação quer ser evidentemente também um encontro com os homens e as mulheres que habitam nesta terra, sobretudo com os nossos irmãos e irmãs na fé no único Senhor, que viveu, também Ele, no Médio Oriente e que nos revela o rosto do Pai todo misericordioso. Não foi nesta terra, na cidade de Antioquia, que é um dos faróis do Oriente, que os discípulos de Jesus de Nazaré foram chamados pela primeira vez "cristãos" (Act 11, 26), isto é, os que professam que Cristo é o Senhor, o Messias de Deus, e que são membros do seu corpo? Por conseguinte, é com profunda alegria que vos dirijo a mesma saudação feita por Cristo depois da ressurreição:  "A paz esteja convosco" (Jo 20, 19).

2. A situação da Igreja católica na Síria é de uma grande diversidade, devido à presença simultânea de várias Igrejas sui iuris, que representam um igual número de grandes e ricas tradições do Oriente cristão. Com paciência, superando progressivamente uma secular interrupção devida a acontecimentos históricos, as vossas comunidades e os vossos fiéis abriram-se uns aos outros. Permanecendo contudo firmemente enraizados no vosso património eclesial próprio, e até valorizando-o, aprendestes a juntar os vossos esforços. A Assembleia da Hierarquia católica na Síria, ou ainda mais amplamente o Conselho dos Patriarcas do Médio Oriente, simbolizam esta coordenação indispensável, que eu vos convido a prosseguir, a alargar e a intensificar ainda mais, não obstante as dificuldades que surgirão, para um melhor serviço pastoral aos fiéis que vos estão confiados e para uma real partilha dos tesouros espirituais das vossas respectivas tradições. De facto, se é verdade que a comunhão é em primeiro lugar um dom de Deus à sua Igreja, não há dúvida de que a este dom devem corresponder da nossa parte o discernimento, o respeito, a estima recíproca e a paciência. Estes diferentes elementos fazem com que a diversidade concorra para a unidade; eles dão testemunho da catolicidade da Igreja, e sobretudo glorificam o Nome de Deus e servem o anúncio do Evangelho, tornando cada vez mais credível a palavra dos irmãos unidos na fé e no amor.

Esta comunhão entre as instâncias das vossas diferentes Igrejas nada tira, antes pelo contrário, à comunhão episcopal que reina no seio dos vossos respectivos Sínodos. Ela é uma expressão da mais ampla comunhão católica, que deve ser sempre praticada e reavivada.

3. Ao considerar as realidades concretas que marcam a vida das vossas comunidades, desejaria convidar-vos a partir de novo de Cristo, a fundar nele toda a vossa existência. Voltando de novo a ele, indo beber todos os dias à fonte viva da sua Palavra e dos seus sacramentos, a Igreja encontra a força que a faz viver e que a ampara no seu testemunho. O exemplo de São Paulo, na carta aos Gálatas:  "Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim" (Gl 2, 20), faz-nos compreender cada vez mais este mistério da presença de Cristo na nossa vida:  "E Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo" (Mt 28, 20). Presença confortadora que nos apazigua e nos tranquiliza nos nossos caminhos, porque Cristo está connosco, presença exigente  que  nos  obriga  a  não  guardar  para  nós  o  tesouro  que  recebemos:  "Ai de mim, se não evangelizar!" (1 Cor 9, 16).

Estimados Irmãos, encontramos aqui um caminho de vida espiritual forte, um caminho de santidade, que devemos propor a todos os baptizados das nossas comunidades. Fiéis à alegria de celebrar a Eucaristia, que constitui e reúne a comunidade cristã desde a Ressurreição do Senhor, os crentes encontram nela o alimento para a sua fé:  ao reunirem-se à volta da mesa da Palavra e do Pão da vida, eles superam a dispersão da vida quotidiana e fortificam-se, descobrem cada vez mais a sua identidade de filhos de Deus e consolidam-na, a fim de serem verdadeiras testemunhas na Igreja e no mundo. Na medida em que se enraízam na oração, na escuta atenta da Palavra e no gosto pela liturgia, as nossas vidas abrem-se amplamente às chamadas do Espírito, que nos envia ao largo para anunciar sem receio o Evangelho da paz (cf. Ef 6, 15) e testemunhá-lo em todas as realidades familiares, culturais e sociais da vida da cidade humana. São Paulo, arrebatado pela graça da chamada de Cristo, deu testemunho mais do que qualquer outra pessoa da novidade cristã, e ensinou-a abundantemente. Ele próprio foi seduzido por uma vida totalmente nova, consagrada a Cristo e ao anúncio do Evangelho de modo total.

4. Desejo mais uma vez exprimir toda minha admiração ao ver a concórdia que reina entre os cristãos da Síria. A presença de Sua Santidade Mar Inácio Zlkka I e de Sua Beatitude o Patriarca Inácio IV é disto um sinal eloquente. Beatitude Inácio IV, comoveram-me as suas recentes declarações sobre a profundidade da comunhão fraterna que existe neste Pais entre as Igrejas cristas e que Vossa Beatitude deseja reforçar cada vez mais. Aproveito esta ocasião para saudar fraternalmente também Sua Beatitude o Cardeal Inácio Moussa Daoud, Prefeito da Congregação para as Igrejas Orientais, que recentemente chamei para Roma, a fim de ser o digno representante de todo o Oriente católico. Saúdo de igual modo Sua Beatitude o Patriarca sírio-católico Inácio Pierre VIII, bem como os outros Patriarcas, Cardeais e Bispos presentes. O verdadeiro entendimento que existe entre Patriarcas, Bispos e dignitários das Igrejas e Comunidades eclesiais do vosso Pais é um bom testemunho do amor cristão, num País em que a maioria dos cidadãos pertence à religião muçulmana.

De facto, recordamo-nos de que foi na Síria que a Igreja de Cristo descobriu o seu verdadeiro carácter católico e assumiu a sua missão universal. Os Apóstolos Pedro e Paulo, cada um segundo a sua própria graça, trabalharam aqui para reunir a única família de Cristo, acolhendo fiéis que provinham de diversas culturas e de diferentes nações. É com satisfação que podemos ver desenvolver-se a colaboração entre as Igrejas e Comunidades eclesiais. Ela não pode deixar de contribuir para servir a reconciliação e a busca da unidade. Que esta aproximação vos ajude a testemunhar sempre mais a credibilidade de Jesus Cristo, morto e ressuscitado para "trazer à unidade os filhos de Deus que andavam dispersos" (Jo 11, 52). Oxalá esta colaboração também contribua para tornar mais bonita e mais autêntica a Igreja de Cristo, aos olhos dos fiéis das outras religiões.

Por seu lado, os fiéis apreciam em grande medida as ocasiões que lhes são oferecidas de participar numa oração ecuménica comum. Esta abertura deverá prevalecer cada vez mais e promover todas as iniciativas nas quais a Igreja pode cooperar em todos os campos.

De facto, a divisão dos cristãos é um obstáculo para o Evangelho. Além disso, "o ecumenismo não é apenas uma questão interna das Comunidades cristãs, mas diz respeito ao amor que Deus, em Cristo Jesus, destina ao conjunto da humanidade; e dificultar este amor é uma ofensa a Ele e ao seu desígnio de reunir todos em Cristo" (Ut unum sint, 99). Por terem vivido tao próximos dos crentes muçulmanos durante séculos, os cristãos da Síria descobrem imediatamente o vínculo íntimo entre a unidade da comunidade e o testemunho que surge da comunhão fraterna.

Também neste âmbito, encorajo-vos a manter um diálogo autêntico na vida quotidiana, impregnado de respeito recíproco e de hospitalidade. Não receberam Abraão e Sara o dom do filho prometido, por terem comido, segundo a tradição repleta de poesia referida por Santo Efrém, o Sírio, os restos da refeição oferecida aos três Anjos?

5. Sem dúvida, as preocupações não faltam aos Pastores. A mais lancinante, sem dúvida alguma, é a emigração de tantas famílias cristãs, e de numerosos jovens. Todos esperam encontrar noutras partes um futuro melhor. Tenho a certeza de que cada um de vós se fez muitas vezes a pergunta angustiante:  que posso fazer? Vós podeis fazer muito. Em primeiro lugar, o vosso contributo para a construção de uma pátria próspera economicamente, na qual cada cidadão tem os mesmos direitos e deveres perante a lei, todo o povo se preocupa por viver uma paz equitativa tanto no interior das suas fronteiras como com todos os seus vizinhos. Contribuir para aumentar a confiança no futuro da vossa pátria é um dos maiores serviços que a Igreja pode prestar à sociedade.

Encorajar os cristãos à solidariedade, partilhando as dificuldades e os sofrimentos do vosso povo, constitui outro meio de acção. A vossa influência sobre a juventude é grande:  falai ao seu coração generoso explicando, corrigindo, encorajando, e principalmente inculcando-lhe, mediante o vosso exemplo pessoal, a convicção de que os valores cristãos do coração e do espírito podem dar mais felicidade ao homem do que todos os bens materiais. Transmiti aos jovens um ideal humano e cristão, e fazei com que descubram que, como já dizia o autor da epístola a Diogneto, "o lugar que Deus lhe destinou é tão nobre, que não lhe é consentido desertar" (VI, 10).

Neste espírito, o diálogo inter-religioso e a colaboração recíproca, particularmente entre cristãos e muçulmanos, é um importante contributo para a paz e para o entendimento entre os homens e entre as comunidades. Ele também deve conduzir a dar um testemunho comum em favor de um pleno reconhecimento da dignidade da pessoa humana.

6. Queridos Irmãos em Cristo! Não posso concluir melhor estas palavras de conforto fraterno do que fazendo minhas as recomendações de São Paulo aos anciãos da Igreja de Éfeso:  "Tomai cuidado convosco e com todo o rebanho de que o Espírito Santo vos constitui administradores para apascentardes a Igreja de Deus, adquirida por Ele com o Seu sangue" (Act 20, 28).

Que este mesmo Espírito vos de a força, mediante a Páscoa de Nosso Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus e filho do homem, à glória de Deus, nosso Pai! Confio-vos à Virgem Maria, a Theotokos que a vossa linda liturgia nao se cansa de cantar, ela que é "a nossa irmã cheia de prudência [...] o tesouro da nossa felicidade" (Santo Efrém, o Sírio, Opera II, 318) e que, a partir da Última Ceia, vigia maternalmente sobre a Igreja.

 



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