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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
AO SENHOR PRIIT KOLBRE
NOVO EMBAIXADOR DA ESTÓNIA
 JUNTO DA SANTA SÉ*

12 de Dezembro de 2003

 

Excelência

É com prazer que lhe dou as boas-vindas ao Vaticano, no momento em que Vossa Excelência apresenta as Cartas Credenciais mediante as quais é designado como Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário da República da Estónia junto da Santa Sé. Pedir-lhe-ia a amabilidade de transmitir a Sua Excelência o Senhor Arnold Rüütel o meu apreço pelos seus bons votos, que gostaria de retribuir calorosamente assegurando-lhe, assim como a toda a população da Estónia as minhas orações pelo bem-estar da sua nação. Há dez anos, realizei a minha "peregrinação da paz" a vários países bálticos, inclusivamente à sua querida nação, onde dei graças a Deus pela "lâmpada da liberdade", que então acabava de ser novamente acesa. Essa visita permanece vivamente gravada na minha mente, enquanto recordo de bom grado o afecto e a hospitalidade que então me foram reservados pelos líderes tanto civis como religiosos da nação.

As relações diplomáticas da Igreja fazem parte da sua missão de serviço em prol de toda a família humana. O seu desejo ardente de promover relações fecundas com a sociedade civil está fundamentado sobre a sua convicção de que a esperança de edificar um mundo mais justo um mundo mais digno do homem não pode ignorar a compreensão da vocação sobrenatural do homem. Por conseguinte, a actividade diplomática da Santa Sé procura promover um entendimento da pessoa humana, que "recebe de Deus a sua dignidade essencial e com ela a capacidade de transcender todo o regime da sociedade, rumo à verdade e ao bem" (Carta Encíclica Centesimus annus, 38). A partir deste fundamento, a Igreja aplica os valores universais relativos à verdade e ao amor, à vasta gama de culturas e de nações que constituem o nosso mundo contemporâneo.

Como Vossa Excelência quis observar, a chegada da Igreja católica à Estónia remonta ao século XII. Juntamente com os outros europeus, os estonianos compreendem justamente que as verdades e os valores da cristandade constituíram o fundamento do próprio tecido da sociedade europeia. Contudo, esta herança não pertence ao passado. Ela é um projecto sempre em acto. Por conseguinte, é imperativo que, enquanto as nações da Europa estão a procurar uma nova configuração, a proclamação perene da cristandade deveria ser reconhecida e reclamada. É mediante a recuperação da verdadeira identidade da Europa, sobre a qual estão fundamentadas a sua liberdade e democracia, que se poderá assegurar o progresso autêntico das suas instituições culturais e cívicas (cf. Exortação Apostólica pós-sinodal Ecclesia in Europa, 109).

O povo da Estónia sabe muito bem que, quando o tesouro da fé cristã é ignorado ou até mesmo negado, definham o desenvolvimento social autêntico e a visão de uma sociedade caracterizada pela esperança. Na linha de um trágico período de medo e de intimidação na história da Europa, em que está a prevalecer a supremacia da força, a fé cristã propõe o seu Evangelho de vida, garantindo um futuro de esperança e de liberdade, um porvir em que a supremacia do amor e da verdade hão-de prevalecer. Não se pode permitir que um sentido desnorteado ou superficial da inclusão negue às futuras gerações este caminho de realização pessoal autêntica e de solidariedade sustentável entre os povos, arraigado sobre a esperança que "não desilude" (Rm 5, 5). A este propósito, estou persuadido de que o governo da Estónia ajudará os esforços da Santa Sé, em vista de assegurar que o Tratado da Constituição da Europa reconheça o lugar da cristandade no âmago da vida e do futuro deste Continente.

Enquanto a Estónia continua a comprometer-se na delicada mas profundamente satisfatória tarefa de forjar o seu espírito nacional, há muito que agradecer. A liberdade de pensamento e de expressão, de que gozam os seus cidadãos hoje em dia, constitui uma condição para a busca da verdade que define a pessoa humana. Todavia, a experiência da história ensina-nos que a caminhada da opressão rumo à liberdade é árdua. Ela é frequentemente assinalada por promessas vazias de esperança e pela miragem da falsas formas de liberdade, desapegadas de um vínculo essencial com a verdade. Não se deve permitir que a passagem de uma era de ideologia política repressiva leve a uma era de ideologia secularista destruidora. A pessoa humana que busca a verdade vive também pela fé (cf. Carta Encíclica Fides et ratio, 31). Por conseguinte, é nas comunidades de crentes que as autoridades políticas e civis podem encontrar com confiança um compromisso em benefício da humanização da sociedade, forjando uma ordem social europeia no respeito de cada homem e de cada mulher e, desta maneira, de acordo com o bem comum (cf. Exortação Apostólica pós-sinodal  Ecclesia in Europa, 117).

Não há dúvida de que uma das maiores necessidades da Estónia contemporânea consiste em assegurar que seja garantida e promovida a instituição sagrada do matrimónio, desejada por Deus no próprio acto da criação, com a consequente vida familiar estável. Tanto os líderes civis como os religiosos de todas as denominações devem trabalhar em conjunto, visando esta finalidade. Com efeito, numerosos factores culturais, sociais e políticos estão a conspirar para criar uma crise cada vez mais óbvia da família. A tragédia do divórcio arrasa a vida familiar e prejudica as comunidades e os indivíduos, de modo especial os filhos. O flagelo do aborto, além de violar a dignidade fundamental da vida humana, muitas vezes causa dores emocionais e psicológicas inauditas à mãe que, ela mesma, é frequentemente vítima de circunstâncias contrárias às suas esperanças e aspirações mais profundas. Diante de tais aflições, volto a recordar aos líderes civis que eles têm o dever de fazer opções corajosas em ordem a proteger a vida através de medidas legislativas (cf. Carta Encíclica Evangelium vitae, 90) e a fomentar os valores e as exigências da família, mediante políticas sociais que sejam realmente eficazes. Exorto também a comunidade cristã que está na Estónia a dar testemunho constante da beleza sublime da comunhão íntima de vida e de amor, que define a família e incute alegria na sociedade humana.

Os membros da Igreja católica, embora sejam pouco numerosos no seu país, continuarão a rezar e a trabalhar pela continuidade do desenvolvimento do povo e da nação estonianos. Agradeço-lhe, Senhor Embaixador, as suas amáveis palavras de estima a respeito daquilo que a Igreja católica está a realizar através das suas organizações humanitárias, nomeadamente mediante a Cáritas, levando um espírito de esperança e assistência concreta aos grupos mais vulneráveis. A sua missão de serviço a todos os povos, particularmente aos pobres e marginalizados, encontra-se no cerne do seu testemunho do amor totalmente misericordioso de Jesus Cristo.

Senhor Embaixador, durante o período do seu mandato como representante da Estónia junto da Santa Sé, os vários departamentos da Cúria Romana farão tudo o que puderem para o ajudar no cumprimento dos seus deveres. Formulo os meus melhores votos pelo bom êxito dos seus esforços em vista de fortalecer as relações de cordialidade que já existem entre nós. Sobre Vossa Excelência, a sua família e todos os seus compatriotas, invoco as copiosas bênçãos de Deus Todo-Poderoso.


*L'Osservatore Romano n. 52 p. 9.

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