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DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II
À SENHORA RAYCHELLE AWUOR OMAMO
NOVA EMBAIXADORA DO QUÉNIA
JUNTO DA SANTA SÉ POR OCASIÃO
DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS*

16 de Dezembro de 2004

 

Excelência

É com prazer que, hoje, faço extensivas as minhas cordiais saudações a Vossa Excelência e que aceito as Cartas Credenciais mediante as quais é designada Embaixadora Extraordinária e Plenipotenciária do Quénia junto da Santa Sé. Embora as minhas visitas pastorais ao seu país tenham sido realizadas há diversos anos, elas permanecem claramente gravadas na minha mente, como acontecimentos de grande alegria. Agradeço-lhe as saudações que me transmitiu da parte do Senhor Presidente Kibaki, do Governo e de todos os cidadãos do Quénia. Peço-lhe que tenha a amabilidade de lhes comunicar os meus sinceros bons votos e a certeza das minhas preces pelo bem-estar da nação.

Quando cheguei a Nairobi, em 1995, pude observar que a sua nação e, efectivamente, todo o continente africano, se encontravam numa encruzilhada (cf. Discurso de chegada, Nairobi, 18 de Setembro de 1995). As suas populações e os seus líderes estavam a ser interpelados a pôr em prática toda a sua sabedoria no cumprimento da difícil e urgente tarefa de promoção de um governo democrático e de um desenvolvimento económico prudente, como elementos essenciais para a edificação de uma sociedade justa. Os "ventos de transformação" que alimentavam aquela aspiração conjunta não diminuíram; na realidade, adquiriram uma força ainda maior, enquanto os povos exigem acções cada vez mais insistentemente concretas, em vista de assegurar o progresso de uma vida cívica caracterizada pelo respeito, justiça e integridade (cf. Ecclesia in Africa, 44).

Hoje podemos dizer que o Quénia está encaminhado pela vereda da verdade e da paz. Opondo-se às consequências frequentemente inquietantes das tragédias humanas, que continuam a afligir o continente africano e outras regiões, a sua nação assumiu um papel de liderança na promoção de iniciativas de paz e de estabilidade social. A este propósito, a recente Assembleia do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, reunida na capital do seu país, dedicou uma atenção muito positiva ao Quénia, através dos meios de comunicação internacionais, granjeando-lhe a justa estima pela notável participação da sua nação nas missões e projectos de manutenção da paz, especialmente no Sudão e na Somália. Enquanto proporcionam alívio imediato às populações que estão a sofrer há demasiado tempo, porque são directamente atingidas pelos vários conflitos, estes empreendimentos generosos irão despertar também nos seus países confinantes um maior sentido de responsabilidade comum pela defesa e pela promoção dos direitos humanos fundamentais dos povos da vossa região. Quando há hesitação no seio da comunidade internacional, no que se refere à obrigação a respeitar e a realizar os direitos humanos (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz de 2003, n. 5), a miséria acaba por prevalecer, como actualmente é muito evidente no Darfur.

Além da vontade de participar nos acordos e consensos, em vista de promover as relações internacionais, o desenvolvimento autêntico exige também a adesão dos países a um sólido plano de progresso nacional genuíno. Com efeito, o "vínculo inabalável entre a obra de paz e o respeito pela verdade" (Ibid., n. 8) sugere que o bom êxito da participação de um governo nos processos de paz no estrangeiro há-de depender em grande medida do nível de honestidade e de integridade com que ele mesmo governa no interior da sua nação. A este propósito, a determinação com que o Senhor Presidente Kibaki se esforça em vista de desarraigar o flagelo da corrupção, que debilita o espírito da nação, merece ser elogiada e exige um apoio concreto da parte de todos os líderes políticos e burocratas, a fim de que o bem comum possa florescer. Embora ainda haja muito a fazer, os êxitos já alcançados no Quénia são claramente um sinal de esperança. Ulteriores e vigorosos esforços, em vista de assegurar uma magistratura imparcial e de garantir a segurança através das normas da lei e da ordem, ainda são necessários e hão-de contribuir em grande medida para promover um espírito de optimismo entre os seus cidadãos e para atrair os investimentos necessários para a criação de oportunidades de emprego, que ofereçam um futuro melhor a todos e especialmente aos mais jovens.

A família permanece no coração das culturas da África. Trata-se de um tesouro que deve ser conservado e jamais subestimado, porque o futuro dos jovens do seu país e do mundo inteiro passa através da família (cf. Familiaris consortio, 86). Por conseguinte, é justo que os líderes civis e religiosos trabalhem em conjunto para assegurar que a sagrada instituição do matrimónio, com a correspondente vida familiar estável, seja confirmada e assistida. A crise da vida familiar constitui sempre uma fonte de problemas insolúveis que, além de causar aflições incalculáveis aos indivíduos, debilita o próprio tecido da sociedade e os seus instrumentos de desenvolvimento seguro.

Embora continuem a ter confiança no futuro, as populações do Quénia estão, contudo, a sofrer devido a alguns profundos problemas sociais. As soluções não podem ser restringidas à mera remoção das dificuldades mas, ao contrário, exigem a coragem de abraçar um estilo de vida em fidelidade ao plano de Deus para todos os homens e mulheres. A este propósito, observo com profunda preocupação as medidas que actualmente estão a ser consideradas no seu país, para facilitar o aborto. Além de violar a dignidade essencial da vida, o aborto causa invariavelmente sofrimentos emotivos e psicológicos inauditos à mãe, que com muita frequência é vítima de circunstâncias contrárias às suas esperanças e aspirações mais profundas. De maneira análoga, no que se refere à tragédia da Sida, que actualmente toda a família humana está a enfrentar, é necessário recordar que, em última análise, se trata de uma questão de comportamento. A proposta de soluções que ignoram ou rejeitam o único fundamento genuíno da saúde e da felicidade a este propósito fidelidade sexual no seio do matrimónio e abstinência fora dele tendem a aumentar, em vez de resolver esta tragédia e, efectivamente, podem ser entendidas como renovadas formas de colonialismo. Portanto, dirijo um apelo à comunidade cristã do Quénia, para que dê um testemunho constante da íntima comunhão de vida e de amor que define a família, que dá alegria às comunidades e oferece um fundamento sobre o qual as aspirações de uma nação podem ser edificadas.

Por sua vez, a Igreja Católica que está no Quénia continuará a apoiar as famílias de todas as maneiras possíveis, trabalhando como uma aliada na busca da paz, da estabilidade e da prosperidade. Através das suas numerosas escolas, dos seus centros de assistência à saúde e dos seus programas de desenvolvimento das comunidades, actualmente ela já está a contribuir em grande medida em vista de assegurar um futuro melhor para o seu país. Neste serviço, a Igreja não aspira a poderes, nem a qualquer privilégio, mas unicamente à liberdade de dar expressão à sua fé e caridade nas obras de bem, de justiça e de paz.

Excelência, no momento em que a Senhora Embaixadora entra na comunidade diplomática acreditada junto da Santa Sé, garanto-lhe a pronta assistência dos vários Departamentos da Cúria Romana. Que a sua missão contribua para aprofundar os vínculos de compreensão e cooperação, já vigorosos, existentes entre o Quénia e a Santa Sé. Sobre Vossa Excelência, a sua família e os seus compatriotas, invoco cordialmente as abundantes bênçãos de Deus Todo-Poderoso.


*L'Osservatore Romano 2005 n. 2 pp. 4, 5.

 

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